Quando Daniela Cachich chegou na Ambev em 2021, a empresa passava por uma grande transformação cultural e de negócios. A cerveja era o indiscutível carro-chefe, mas quanto mais a companhia ouvia os consumidores, mais clara ficava a necessidade de mudanças. Os mais jovens, preocupados com a saúde e tendo menos dinheiro no bolso, consomem menos álcool regularmente. Por outro lado, a Ambev sabia que os consumidores queriam, por exemplo, sabores mais doces e novos tipos de combinação de sabores.
Para atender a essa demanda nasceu a divisão “beyond beer”, que lançaria produtos com álcool, mas que iriam além da cerveja. Cachich, atual presidente de Beyond Beer da Ambev, chegou em 2021 na empresa com a missão de criar essa divisão. Um ano e meio depois, assumiu também os não alcoólicos.
A executiva diz que hoje a Ambev “não é apenas uma cervejaria, é uma grande plataforma que está se estruturando para poder inovar”. Segundo ela, mais de 20% da receita já vem de produtos que não existiam no mercado há dois anos. “O portfólio do qual sou responsável tem uma penetração muito maior de jovens de 18 a 24 anos. Tem uma penetração muito maior no público feminino. Então, ele é complementar, é incremental ao portfólio que a gente tem com as nossas grandes marcas de cerveja”.
No último trimestre, o volume de cervejas da Ambev no país recuou 1,1%, caindo para 23,5 milhões de hectolitros, enquanto a divisão brasileira de bebidas não-alcoólicas ampliou seus volumes em 2,8%, somando quase 8 milhões de hectolitros. A receita da divisão de bebidas não-alcoólicas chegou a R$ 1,72 bilhão no último trimestre, alta de 5,1% em relação ao mesmo período de 2022.
Como o último trimestre da Ambev mostrou, os lançamentos não apenas têm compensado a desaceleração do mercado de cervejas, como ajudaram a aumentar o lucro. A receita líquida cresceu mais de 19% no período.
A seguir, Cachich fala das estratégias que levaram a Ambev a acelerar seu ciclo de lançamentos com produtos chegando às prateleiras em apenas quatro meses, e a importância da escuta ativa dos consumidores:
Valor: Você tem defendido a escuta ativa das marcas. O que é isso?
Cachich: Vou começar resgatando o momento em que cheguei na Ambev em agosto ou setembro de 2021, há mais de 2 anos. Eu cheguei em um momento onde a companhia estava passando justamente por uma grande transformação cultural e de negócios, uma coisa está ligada a outra, obviamente. Era o momento onde a Ambev estava se preocupando em ser uma grande plataforma. Essa plataforma tem, obviamente, como o grande carro chefe da companhia a cerveja, mas ao mesmo tempo, por conta justamente dessa escuta ativa, da gente escutar as demandas dos consumidores. Havia as questões: o que eles estão querendo? O que eles estão sentindo falta no nosso portfólio? O que elas gostariam que a Ambev oferecesse para elas?
E uma vontade nossa como companhia é que cada um tenha uma Ambev para chamar de sua. Então foi criada uma divisão que a gente chama de “beyond beer” ou a gente chama de “match” pela mistura de álcool, tendências. A gente sabe que tem marcas em portfólio de cerveja muito robustas e muito importantes para a história do Brasil. A gente tem um portfólio de não alcoólicos, também muito representativo com marcas nossas e marcas da parceria que a gente tem com o Pepsico.
Valor: Como isso se conectada à sua área?
Cachich: A gente também foi escutar esse consumidor que estava entrando, esse jovem adulto acima de 18 anos, que estava entrando no universo de bebidas alcoólicas e queria sabores mais doces, queria outros tipos de combinação de sabores, e a gente foi lá e fala, mano a gente tem Beats, que é uma marca que já tem mais de dez anos no mercado, começou como Skool Beats, mas a gente pode ter um portfólio. E aí eu vim com esse mandato. Com essa missão de criar uma divisão para a Ambev, uma divisão de negócios focada em alcoólicos que não fossem cerveja.
Então acho que isso já mostra um pouco desse olhar. Se a gente não amplificar o nosso portfólio e não oferecer diversas opções trazendo opcionalidade para as pessoas, a gente vai deixar de estar escutando a demanda dos consumidores e vai deixar de transformar isso numa realidade através de um portfólio de produtos.
Não é apenas uma cervejaria, é uma grande plataforma que está se estruturando para poder inovar. Hoje, mais de 20% da nossa receita vem de produtos de inovação, produtos que a gente não tinha no mercado. O portfólio do qual sou responsável tem uma penetração muito maior de jovens de 18 a 24 anos. Tem uma penetração muito maior no público feminino. Então, ele é complementar, é incremental ao portfólio que a gente tem com as nossas grandes marcas de cerveja.
Então eu vim nesse momento, depois de mais ou menos um ano e meio que eu estava na companhia, surgiu a oportunidade de também abraçar o business de não alcoólicos. Então, hoje a gente tem uma divisão que a gente chama de beyond beer. Então a gente tem a Beer, que é cerveja, e a gente tem uma outra divisão que é beyond beer, que ela tem justamente os não alcoólicos e tem os alcoólicos que não são cerveja.
É uma divisão de negócios que hoje inova muito, traz muitas novas ofertas para os consumidores e isso vem porque a gente está escutando o que os consumidores querem.
Valor: Por que é tão difícil para as marcas ouvirem o consumidor?
Cachich: Não sei se a gente tem uma barreira interna. Acho que é uma evolução. Até pouco tempo atrás, a gente não tinha nem rede social. A gente se esquece disso, mas não é tão distante. E ouvia-se pouco o que as pessoas falavam. Tinha uma lógica muito de que a marca define, lança, o consumidor consome e você não tinha essa retroalimentação de se eu gostei, se eu não gostei, o que eu desejo, o que eu espero, o posicionamento, enfim, o propósito. Acho que a gente vem numa evolução.
Valor: Como assim?
Cachich: As marcas foram aprendendo a escutar isso e trazendo para as discussões de estratégia, de posicionamento, o que as pessoas estão falando… se isso é relevante, se não é relevante para as pessoas. As marcas estão numa evolução. Algumas marcas evoluem mais rápido, outras menos. Aqui na Ambev escutamos o tempo inteiro esse mar aberto, o consumidor, a gente se provoca. Estamos o tempo inteiro inquietos, nos provocando nisso.
Valor: De que forma é feita a escuta ativa, por redes sociais?
Cachich: É uma combinação de várias coisas. É desde mar aberto e escutar o que as pessoas estão falando, até a gente fazer uma série de entrevistas com grupos de foco. Temos ainda um grupo de consumidores de diferentes perfis. A gente testa produtos em primeira mão com eles e entende a adaptabilidade, ou até mesmo quando a gente coloca produtos no Zé Delivery [serviço da Ambev que entrega bebidas geladas e petiscos] que ainda não estão em nenhum lugar para entender qual é a atratividade deles, o que tem o maior giro, e depois escalamos isso. Temos também pilotos acontecendo no Brasil inteiro, que pouca gente sabe, em diferentes capitais do Brasil. Para entender a atração e depois colocar nacionalmente. Então é uma combinação de várias ferramentas que a gente usa para ter cada vez mais essa intimidade com o consumidor.
Valor: Qual é o maior desafio das empresas para inovar?
Cachich: Eu falaria três coisas, ou três frentes. A primeira é, justamente, a questão da escuta. A gente tem que estar escutando o que o consumidor quer. É menos sobre ‘eu tive uma ideia brilhante e danem-se as pessoas’ e muito mais de ‘estou escutando’. Mas é uma escuta diversa e representativa, e não uma disputa de um recorte ou de uma bolha. A grande questão é como você fura a bolha, como é que você escuta? Eu falo muito sobre a gente estar escutando o nosso algoritmo. A gente está escutando o Brasil? Muitas vezes a gente está escutando apenas o nosso algoritmo como executivo e a gente não está escutando o Brasil.
O segundo é a velocidade. Hoje a gente consegue, na nossa área de drinques prontos, colocar uma inovação na rua em quatro meses. No passado demorava um ano e meio, dois anos. Quando isso ficava pronto, já não era mais uma tendência. Então, a questão da velocidade, é bem importante. CaipiBeats foi uma inovação que lançamos em quatro meses. No passado demorava de um ano a dois anos. Neste tempo, quando você lança, já não é mais tendência.
E o terceiro, é a capacidade de focar em poucas coisas que possam realmente criar escala. Muitas vezes as companhias se perdem fazendo tantas inovações pequenas que são pouco relevantes, e aí perde-se o foco e a gente não consegue extrair o máximo daquela inovação. Então, por exemplo, lançamos a CaipiBeats no final de dezembro, fizemos a distribuição em janeiro, em novembro o nosso volume foi 90% maior do que o previsto. Aí é uma inovação. Sempre falo de focar em “big bets” [grandes apostas]. Quais são as suas grandes apostas? Porque como uma empresa que está escutando muito, podemos cair numa armadilha de fazer tantas inovações que elas não ganham escala suficiente e elas perdem o foco.
Valor: Qual o principal desafio de inovação da sua área?
Cachich: Não sei se é exatamente desafio, mas é a nossa missão aqui. Por um lado, quando a gente fala de alcoólicos que não são cervejas, lideramos a construção e o crescimento da categoria de drinks prontos no Brasil. Drinks prontos é a categoria que tem a maior taxa de crescimento dentro do mercado do mundo alcoólico.
Tem uma questão de conveniência e de poder entrar em novas ocasiões de consumo com o drink pronto. Para te dar um dado: 63% dos novos consumidores de Beats são novos consumidores para a categoria de drinks prontos. Beats é uma marca que consegue recrutar. Ela recruta novos consumidores para a categoria. O grande desafio que a gente tem aqui, ou a nossa missão, é continuar liderando a construção da categoria. A gente vem aprendendo há muitos anos, como eu te falei, há mais de dez anos a gente vinha flertando com a categoria e com a construção da divisão mesmo de negócio, a gente vem liderando esse crescimento.
Valor: Alguns investidores começam a questionar a eficácia do uso do propósito de marca e algumas companhias parecem estar dando marcha a ré na agenda ESG. Qual sua avaliação?
Cachich: Acreditamos muito na nossa responsabilidade e em como vamos impactar a sociedade onde operamos. Temos as nossas metas, uma série de coisas que mensuramos para poder chegar onde a gente acredita que temos que chegar. Nessa hora, quando a gente está falando de ESG, está falando de propósito, está falando de marcas, tem que estar muito intrinsecamente ligado à estratégia da companhia. Se estiver ligada à estratégia da companhia, isso vai gerar impacto positivo e a gente vai gerar valor. E é assim que a gente faz aqui na Ambev. A gente tem clareza disso, está ligado ao nosso ‘core business’, está ligado ao nosso negócio. É isso que vai ajudar a gente a entregar um crescimento sustentável no médio e no longo prazo.
Existem frentes que dão um resultado mais de curto e frentes que dão resultados mais de médio e mais de longo prazo. E aí tem uma palavra que é muito importante: consistência. A consistência é o que prova que quando a gente tem clareza de para onde essa companhia vai, quais são os pilares de crescimento e quais são os pilares que impactam positivamente a sociedade, a gente consegue entregar um crescimento sustentável. Existem vários elementos dentro do mundo corporativo quando a gente fala de consistência, de mensuração. Todas essas frentes têm que estar ligadas ao ‘core business’ da companhia.
Valor: Em novembro aconteceu o “sustainability day” na Ambev, um evento para o mercado financeiro e analistas. É a segunda vez que acontece e teve um maior número de participantes. O que isso significa?
Cachich: Isso está ligado à consistência, que não é algo que eu vou trazer como companhia esse ano e o ano que vem, e desisto. É algo que estou consistentemente construindo e garantindo que seja uma frente importante para a companhia. E realmente, o “sustainability day” foi impressionante. A quantidade de pessoas, a quantidade de perguntas, a quantidade de interesse. Acreditamos muito nessas frentes.
Valor: Recentemente tivemos o “cancelamento” de marcas como Bis (da Mondelez) e Bud Light (da AB InBev, controladora da Ambev) nas redes sociais. Em uma sociedade cada vez mais polarizada, como a Ambev reduz esse risco sem perder o propósito da marca?
Cachich: Vou falar com a experiência que tenho das marcas que lidero. A gente tem, por exemplo, uma parceria de longa data com a [cantora] Anitta. A Anitta é a nossa rede de inovação e criatividade. As nossas discussões são sempre perante inovações de produto, o que faz sentido para a audiência, o que faz sentido para o nosso público, que também é o público dela. Consistência é a chave. A gente está com ela desde 2019. A gente vem fazendo uma construção onde tem um diálogo anualmente, semestralmente, de quais são as estratégias da marca, para onde a gente quer ir, o que a gente quer construir, quais são os desafios de inovação.
Quanto mais tivermos relações que sejam consistentes e duradouras e a clareza de quais são os desafios do que a gente quer construir junto enquanto marca, enquanto enquanto negócio, a nossa experiência é muito positiva. Porque ela é uma experiência muito focada na construção de um negócio, né? Ela é uma pessoa muito influente, mas a nossa relação com ela é uma relação sobre a construção de um negócio junto. Então a minha experiência… e eu já tive experiência com ela quando eu trabalhei na Pepsico. Então assim, a minha experiência é muito boa, porque a gente direciona os nossos esforços em pensar em como a gente vai construir esse negócio junto.
Valor: A Ambev tem realizado encontros que aproximam veículos e influenciadores da periferia da empresa. É parte dessa estratégia de escuta ou é uma estratégia de relações públicas?
Cachich: Faz parte da estratégia de escuta. Eu acho que cada vez mais a gente está escutando diferentes grupos da sociedade, escutando diferentes perspectivas da sociedade para que a gente seja mais relevante. Para ser mais relevante, tem que se abrir para o mercado. Tem que estar mais aberto a escutar mais.
Eu acredito e discutimos muito isso aqui na Ambev, que quanto mais a gente tiver essa escuta no momento onde as pessoas estão loucas para falar, quem tiver genuinamente aberto a escutar vai ter uma vantagem competitiva, vai ter uma vantagem competitiva de negócio, de inovação, de engajamento, de relevância, para que essas pessoas virem nossas “lovers”. A gente fala muito sobre os nossos “lovers”, né? Nossos “brand lovers” [fãs da marca].
Estamos em um mundo no qual as pessoas estão trazendo muito o que elas querem, o que elas acreditam, o que elas esperam, e quem estiver muito focado em escutar isso, terá um ativo muito grande.
Valor: Existe alguma plataforma ou tecnologia que vocês estejam usando que seja uma aposta dentro da área de inovação na Ambev?
Cachich: Para mim, inovação não é só produto. Tendemos a falar que inovação é produto. Eu não acho que inovação é só produto. Processo é inovação, a gente falar do projeto que a gente tem que se chama Bora, que estimula esse empreendedorismo, toda essa questão da gente ajudar parceiros de negócios e que o ecossistema todo se conecta através é de como a gente faz que as nossas parcerias gerem impacto positivo na sociedade, eu acho que isso também é inovação.
Vejo inteligência artificial sendo aplicada na área de logística, isso é inovação. Falamos sobre como levaremos a água Ama para lugares onde as pessoas não têm acesso à água. Isso eu acho que é inovação. Não acho que exista uma área de inovação, existe um “mindset” de inovação todo aplicado à nossa plataforma e ao nosso ecossistema. E é por isso que quando a gente vê o nosso processo de trainee, também aplicamos inovação para esses processos de trainee.
É um “mindset” da companhia. E muito, muito claro do Jean Jereissati, o nosso CEO. O Jean, quando chegou e assumiu a cadeira de CEO, implementou esse “mindset” de inovação na companhia para todas as áreas. Não me vejo como uma área de inovação, eu me vejo em uma área de negócios que traz um portfólio que é inovador para a Ambev, porque estou falando de um portfólio que há 5 anos não era composto desse jeito.
Valor: Isso evita que a área de inovação vire o “puxadinho” da empresa e não parte do negócio?
Cachich: Pensa o seguinte, a Ambev tem duas divisões de negócio, tem a Ambev de Beer e a Beyond Beer. Então, a inovação está em todo o ecossistema, em toda a plataforma, mas justamente a gente transforma essa divisão numa avenida de crescimento. Então, quando a gente pensa no Guaraná Zero, que a gente acabou de lançar a evolução do Guaraná Zero. Teve muita tecnologia colocada por trás, tiveram mais de 100 formulações que a gente testou com milhares de consumidores para chegar num líquido que seja o mais próximo do Guaraná regular e que tenha menos residual de adoçante. Isso também é inovação. Ela é inovação aplicada a um produto, mas teve muita inovação sendo ligada, sendo colocada através do time de “supply” e dos guardiões do Guaraná. São só quatro pessoas na companhia que sabem qual é a formulação de Guaraná. A inovação pode estar em todas as áreas da companhia.
Valor: A Ambev tem usado uma mandala para explicar ao mercado a plataforma e sua visão. Quais são os elementos dela?
Cachich: Vou fazer em um tweet, tá? A gente falou de marcas que os consumidores amam, então a gente está falando dos “brand lovers”. A gente fala de sede para inovar, então “thirsty to inovate”. A gente fala da gente fazer um “toast” com nossos clientes, brindar com nossos clientes, e aí está muito focado em negócios. A gente fala de experiências que a gente leva para as pessoas e aí está muito focado no Zé Delivery. Eu estou simplificando, tá? A gente fala muito de “por um mundo melhor” e aí a gente está falando de todo o impacto social que a gente tem de companhia, e a gente fala de criação de valor, que é como a gente maximiza e otimiza o nosso negócio.
Então, é bem interessante. A gente reporta e a gente olha para todos os programas da companhia colocados nessa mandala. Então, tem uma parte que é inovação de produto, mas em todas as outras cinco a inovação está permeando, e não necessariamente está tangibilizada num produto.
Valor: Anos atrás você já dizia que propósito de marca tinha que ter geração de valor para a companhia. Como ter propósito e gerar resultado ao mesmo tempo?
Cachich: Tem um exemplo que gosto bastante. É a parceria que a gente tem de Beats com o nosso “smart drinking lab”, que é uma área que está o tempo inteiro buscando como que a gente pode trazer moderação para o dia a dia de Beats. É uma marca que fala com jovens de 18 a 24 anos. E a gente trouxe no ano passado a barrinha [de cereais] On my Beats [o consumidor come a barra e sente menos necessidade de beber]. A gente levou isso como uma inovação, onde a gente traz sim a nossa responsabilidade enquanto companhia de falar sobre moderação, mas falar de uma maneira que é menos professoral, de que nada pode, e muito mais explicando o impacto que a gente tem quando a gente tem a moderação, e que quanto mais moderar, mais tempo a gente fala que a gente vai ficar no “rolê”, porque eu estou falando na linguagem do jovem que vai escutar a marca falando.
No fim do dia, se a gente faz isso para o “core” da comunicação para a plataforma, a gente tem um grande momento para a Beats no ano, que é o Carnaval. A gente fala de moderação justamente no Carnaval, para explicar como é importante que a gente consiga falar das duas coisas. Tenho uma Anitta e um Pedro Sampaio parando os seus blocos para falar sobre hidratação, que é hora de todo o mundo tomar água, que todo mundo precisa moderar, porque só moderando que a gente vai poder ficar mais tempo no bloco, se divertindo. Isso está no “core”. A maior ativação que eu tenho no ano eu coloco dentro dessa narrativa.
Valor: O ponto é estar integrada ao negócio, não ser um acessório.
Cachich: Não, não é um acessório. E a gente acredita muito nisso aqui na Ambev. A gente acredita que as marcas que escolhem ter plataformas que façam sentido desse ponto de vista de impacto, têm que estar dentro do plano anual da marca, da narrativa da marca, de como a gente vai se comunicar com as pessoas. Porque no fim do dia é sobre o que você falou, é menos sobre ser um puxadinho e sobre ser algo que permeia a comunicação da marca o ano inteiro. E essa é uma parceria que a gente tem com a área de “smart drinking lab”, com a área de impacto social, e isso vira um grande projeto. Temos um grande projeto para o Carnaval para falar de moderação, da mesma forma que a gente tem o ensaio da Anitta, então isso é negócio.
Existem vários elementos dentro do mundo corporativo quando a gente fala de consistência, quando a gente fala de mensuração, quando a gente fala que isso, todas essas frentes elas têm que estar ligadas ao “core business” da companhia.
Valor: Como presidente de uma divisão da Ambev, o que tira seu sono à noite?
Cachich: O que que tira meu sono? Olha, eu. Eu diria que eu durmo bem.
Valor – Então você precisa lançar um livro ensinando como fazer isso no mundo corporativo…
Cachich – Eu durmo bem. Sendo bem honesta, eu não acho que tem alguma coisa especificamente que tire o meu sono. Na verdade é um grande desafio a gente construir uma avenida de crescimento na Ambev vinda por produtos que não sejam cerveja. Então acho que é menos o que me tira o sono, e mais o que me dá mais energia todos os dias de vir para cá e saber que a gente tem um portfólio incrível sendo construído.
A gente está falando de marcas como Guaraná, como Pepsi, como Gatorade, como Tônica Antárctica, enfim, H2O, Mikes, Beats. A gente acabou de lançar em Brasília uma marca que chama Brutal Fruit, que é um drinque pronto da África do Sul, que é uma grande marca que a gente tem na companhia fora do Brasil e que a gente está trazendo para o Brasil. Então, na verdade, não me tira o sono. Na verdade, eu durmo bem para ter bastante energia para vir para cá e seguir nessa missão que é trazer um crescimento bastante sustentável para a companhia.
Valor: Na sua caixa de ferramentas, qual é a principal peça para manter sua equipe com foco e produtiva?
Cachich: Sempre exerço uma liderança muito próxima. As pessoas quando se sentem ouvidas, elas sentem que você como líder está aqui para servi-las, assim, no sentido de desenvolvê-las, de puxar crescimento, de levar elas mesmo para um lugar melhor do que quando você começou a trabalhar com elas, de crescimento. Assim, elas conseguem entregar muito mais.
Então, sou uma líder muito próxima. Eu invisto muito em criar um time diverso. Invisto muito em trazer diferentes perspectivas, e aí a gente pode falar de gênero, raça, de experiências mesmo, independente de gênero e raça. Eu acho que isso traz uma riqueza, principalmente quando a gente está falando de inovação. Isso traz uma riqueza muito grande e eu acho que tem uma coisa que para mim gosto muito que é assim: eu sou muito curiosa em saber o que as pessoas podem trazer e dar para o nosso negócio, então eu sou uma pessoa que investe em desenvolver mesmo as pessoas.
Valor: O que lhe deixa curiosa neste momento?
Cachich: Boa pergunta. Eu acho que ninguém me fez essa pergunta na vida. Eu vou fazer 50 anos esse mês e acredito que a gente pode ainda aprender muito na vida. O fato de eu estar numa companhia onde, com a experiência que eu tenho e com a idade que eu tenho, sinto que aprendo todos os . É uma coisa que me dá muito, muito prazer de falar: todos os dias eu aprendo mais alguma coisa.
Sou curiosa de aprender. Não existe um tema sobre o qual eu não seja curiosa. Eu sou curiosa assim, de aprender coisas que eu não sei, exatamente como são. Me explica como é que é. Eu acho que às vezes, quando você está num cargo de alta liderança, as pessoas acabam desconfortáveis de dizer que elas não sabem, porque, na verdade, espera-se que a gente saiba tudo. E eu acho que se colocar nesse lugar mais vulnerável de eu não sei tudo, me explica, é o que me ajudou a chegar até aqui.
Valor: E isso irá refletir nos negócios, certo?
Cachich: Eu acho que isso é algo que faz com que a performance do time todo seja boa. Se eu tiver um time bom, a performance do time, do negócio, vai ser boa. Então, eu invisto muito tempo com pessoas. Talvez uma coisa que me tiraria o sono, como você perguntou, seria se eu soubesse que o time não está bem, que as coisas não estão funcionando, porque o negócio vai ser uma consequência da capacidade que aquelas pessoas vão ter de dirigir e criar o negócio. Isso é uma coisa que me preocupa. Como é que a gente consegue trabalhar para que esse time possa trabalhar em equipe, que possa trabalhar bem e que as pessoas estejam crescendo, estejam se desenvolvendo e que sejam profissionais melhores amanhã do que eram ontem. Isso é uma coisa que eu acredito demais.
Valor: É curioso a senhora falar de paciência. Porque todo mundo parece mais impaciente. As marcas também estão mais impacientes?
Cachich: Não sei dizer se elas estão pacientes ou não. Acho que tem uma questão aqui que é: agilidade é diferente de impaciência. Nós somos uma companhia ágil, nós somos uma companhia na qual a gente identifica rápido por meio da escuta ativa e transforma numa inovação. Somos uma companhia ágil. Não necessariamente uma companhia impaciente, porque a questão, pelo menos como eu faço no meu portfólio, eu entendo que cada marca tem um estágio diferente. E o que é o sucesso para cada marca deveria ser diferente, dado que elas estão em estágios diferentes.
O que talvez esteja acontecendo é que a gente está com os mesmos indicadores de performance, ou a gente acredita que os sucessos são esses atributos para marcas que estão em momentos totalmente diferentes. E aí na hora que eu generalizo, dificilmente eu vou acreditar. Eu vou querer acelerar muitas coisas, mas elas têm um tempo diferente para acontecer.
Valor: O desafio é ser rápido sem ser impaciente?
Cachich: A tecnologia nos ajuda a sermos muito mais ágeis, muito mais rápidos, mas eu acho que a gente tem que ser responsável pelo que a gente está colocando como sucesso de negócio, dependendo de qual é a iniciativa.
Valor: Como trabalhar com tantas categorias e entender o que é relevante para o consumidor em cada uma delas e ainda dar o foco em cada uma delas sem se perder?
Cachich – Fazemos as escolhas. As escolhas de quais são as grandes… Eu tive um chefe, eu estava na Unilever, que ele um dia ele virou para mim e falou assim: escolha as suas batalhas. Quais são as batalhas que você vai ter? E a batalha menos no sentido bélico, mas onde você vai focar. Em que você vai ter consistência? Ao longo da minha carreira fui aprendendo que a consistência é o que mais traz resultado no médio e longo prazo.
O que eu tento fazer com os meus pares e com o meu time é a gente escolher um caminho e não ficar toda hora revisitando esse caminho. A gente escolher esse caminho, fazer de forma consistente, medir, entender que está dando certo e o que não está dando certo a gente vai ajustar. Mas ter paciência para que as coisas aconteçam de acordo com a construção de cada uma das frentes. Tem coisas que são mais rápidas, tem coisas que demoram mais. Mas eu acho que ser uma líder que não está toda hora mudando o plano o tempo inteiro, eu acho que isso ajuda muito. E não só na minha área, mas na organização toda. Ajuda com “supply”, com logística, com vendas. Isso me ajuda com muitas frentes dentro da companhia que a gente tem clareza dos planos assim. A gente sempre fala que a estratégia é o que garante que a gente está indo todo mundo no mesmo lugar.
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