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Teto de 100% para juros do rotativo tem efeito misto ao consumidor e economia

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A decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN) de limitar os juros do rotativo do cartão de crédito a 100% da dívida a partir de 3 de janeiro de 2024 não teve impacto relevante nas ações dos bancos nesta sexta-feira (22). Mas não se pode dizer o mesmo quanto ao efeito para o consumidor e a economia.

Na avaliação do planejador financeiro Fabio Louzada, a medida parece muito positiva para o bolso da população. “Afinal, o valor [da dívida no cartão] será menor”, afirma o economista e também fundador da “Eu me banco”.

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“Imagine que você atrasou [o pagamento da fatura do cartão de] R$ 5 mil e aí essa dívida, se não fosse paga, poderia virar R$ 40 mil. Agora, no máxima, vai virar R$ 10 mil, porque é 100% do valor da dívida”.

Fabio Louzada, economista, planejador financeiro e fundador da Eu me banco.

De acordo com as regras atuais do Banco Central, o valor que não é pago no vencimento da fatura do cartão de crédito vai para o rotativo. Após um mês, esse montante tem de ser parcelado, como no crédito pessoal, com juros mais baixos. 

Ainda segundo o BC, o pagamento à vista do valor total da fatura representa cerca de 70% do crédito. Porém, a taxa de inadimplência no rotativo por 90 dias chega a ficar acima de 50%. Além disso,  os cartões de crédito representam 40% do consumo das famílias. 

Educação financeira no radar

Nesse sentido, Louzada afirma que a educação financeira se torna um importante caminho para a redução do endividamento das famílias. Para ele, trata-se de um caminho ainda melhor do que criar “travas” como o teto dos juros do rotativo.

“Se investir em educação financeira, as pessoas vão ter uma cabeça melhor para tomar crédito, entendendo o que de fato é o rotativo de cartão de crédito, o que é o cheque especial”, pondera.

Ainda assim, ele avalia que a nova decisão, de fixar um teto para o juro do rotativo, pode provocar reações negativas na economia. Isso porque as instituições financeiras terão de tomar decisões “mais racionais” na concessão de crédito, pois os juros de 100% nem sempre compensam o risco assumido.

Como consequência, os consumidores com menor capacidade de honrar suas dívidas são os que mais devem sofrer. “Ou seja, o cartão de crédito vai deixar cada vez mais de ser uma forma de pagamento da população mais carente”, avalia.

Duplo impacto

Por isso, o setor de comércio e serviços, em especial pequenas e médias empresas (PMEs), deve sofrer um duplo impacto. De um lado, por causa da necessidade de buscar recursos financeiros. De outro, as PMEs podem sentir as dificuldades do consumidor em obter crédito. 

Segundo a Serasa Experian, as PMEs foram responsáveis pela maior parte (12,2%) da demanda por crédito em novembro, que cresceu 11,9% entre todas as empresas, em base anual. No mesmo período, a busca do consumidor por crédito cresceu 1%, no primeiro número positivo desde maio de 2022.

O economista da Serasa Experian, Luiz Rabi, avalia que esses resultados revelam os primeiros indícios dos efeitos graduais da queda da taxa básica de juros (Selic) e da inflação na economia brasileira, fomentando o crescimento da atividade e a necessidade de capital de giro. 

Cálculos feitos pelo economista no início deste ano para mensurar a inadimplência do cartão de crédito rotativo e do parcelado apontam que, entre março e abril, 31,5% do saldo de R$ 135,6 bilhões de crédito em ambas as modalidades do “plástico magnético” estava inadimplente. Na ocasião, o nível era recorde.

Efeito limitado na bolsa

Já na B3, os papéis do setor financeiro operavam em alta nesta sexta-feira (22), em dia de liquidez reduzida nos negócios neste último pregão antes do Natal. Às 15h30, Bradesco PN (BBDC4) subia 0,90% e Itaú Unibanco PN (ITUB4) avançava 2,07%, enquanto Santander units (SANB11) tinha alta de 1,47%. 

Por sua vez, Banco do Brasil ON (BBAS3) oscilava com variação positiva de 0,02%, assim como BTG Pactual (BPAC11), com valorização de 0,19%. Já Cielo ON (CIEL3) subia 0,66%. No mesmo horário, o Ibovespa ganhava 0,54%, negociado em novo nível recorde. 

Para o Goldman Sachs, a determinação de um teto para as taxas de juros no rotativo do cartão de crédito não representa uma grande mudança estrutural para o setor. Isso porque a maioria dos saldos no rotativo do cartão de crédito giram apenas por cerca de um mês. 

“Portanto, não há uma cobrança superior a 100% do principal, mesmo que a taxa mensal efetiva tenha uma média de aproximadamente 15% e anualizada acima de 400%”.

Goldman Sachs Equity Research, em relatório.

Além disso, o banco de investimentos destaca que as novas regras não alteram a estrutura do parcelamento sem juros, o que era um motivo de preocupação. Ou seja, ainda que a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) tenha criticado a medida, classificando-a como uma “solução temporária”, a mudança deve atingir os bancos em menor intensidade.

Reação adversa

Já as entidades que representam as credenciadoras, como são chamadas as empresas que oferecem o serviço de “maquininhas de cartão”, elogiaram a decisão do CMN. Assim como o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que integra o CMN, junto da ministra do Planejamento, Simone Tebet, e o presidente do BC, Roberto Campos Neto. 

Para Haddad, a limitação é positiva para a população e acaba com uma situação “completamente inapropriada”. Ele lembra que não houve a apresentação de nenhuma proposta de autorregulação por parte dos bancos e, por isso, houve a definição do teto, que estava especificado na lei que instituiu o Programa Desenrola, sancionada em outubro

Em nota, a Associação Brasileira de Instituições de Pagamentos (Abipag) “‘enalteceu” a iniciativa de estabelecer um novo regime a operações de crédito, permitindo que o cartão seja aperfeiçoado. A Abipag cita também a possibilidade de portabilidade do saldo devedor no cartão de crédito, bem como a maior transparência nas faturas. 

Na mesma linha, a Associação Brasileira de Internet (Abranet) avalia que a regulamentação incentiva práticas de crédito responsável, bem como o melhor entendimento das cobranças do cartão. Em nota, a associação diz ainda que a medida tende a impulsionar o acesso ao crédito e o consumo.

Seja como for, o governo tomou medidas para tentar enfrentar um dos grandes problemas da população. Isso porque o cidadão que renegocia sua dívida no cartão de crédito no âmbito do Desenrola possui, muitas vezes, débitos até dez vezes superiores ao original devido às taxas anualizadas acima de 400%. Agora, a dívida só poderá dobrar.

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