Ao iniciar uma nova fase do debate sobre deveres dos grandes usuários de redes de telecom, a Anatel também revelou que aplicações over-the-top das plataformas digitais (ou OTTs) motivaram 10 mil reclamações de consumidores na agência durante o primeiro semestre de 2023.
A informação consta em documento da nova tomada de subsídios envolvendo o ecossistema de telecomunicações e as big techs, que ficará aberta até o mês de abril. No relatório, a reguladora destacou o cenário de substituição de serviços de telecom tradicionais por recursos oferecidos por plataformas (a exemplo do WhatsApp ou Netflix).
“Tal fator tem levado os consumidores a uma dificuldade tremenda de diferenciar quem é o ator responsável pela solução do seu problema”, afirmou a Anatel, classificando o tema como não trivial.
“[O volume de reclamações] denota uma clara confusão dos consumidores acerca do posicionamento de cada agente entre as diversas camadas da cadeia de valor digital. Tal situação ainda é agravada pela inexistência de canais tradicionais de atendimento disponibilizados pelos serviços OTT”.
Por essa razão, o órgão considera o estabelecimento de obrigações mínimas de atendimento aos consumidores destes serviços de valor adicionado como um dos possíveis caminhos para novas regulações. “O que é, para os efeitos regulamentares, um acessório dos serviços de telecomunicações, ou, na expressão da LGT, um SVA, ganha centralidade absoluta sob a ótica do consumidor”, nota a agência.
Convergência
A própria Anatel, contudo, também reconheceu o movimento de convergência entre os serviços das OTTs e das teles, apesar da discordância no debate sobre o uso de redes.
“As peças publicitárias [das operadoras] são sintomáticas de que streaming de vídeo, redes sociais, mecanismos de busca e outros serviços são, essencialmente, a razão de ser dos serviços de telecomunicações para os consumidores”, assinalou.
“As próprias empresas de telecomunicações têm investido nos serviços baseados em Internet. Um dos maiores agentes do mercado do SeAC anuncia seus pacotes não mais de ‘TV por assinatura’, mas de ‘TV & Streaming'”, completou a Anatel. Por coincidência, a Claro anunciou nesta terça-feira, 16, um aprofundamento da sua parceria com a Netflix.
Outros temas
A falta de canais de atendimento não é o único ponto de atenção da Anatel diante da relação das big techs com o consumidor. A agência também considera medidas para proteção de dados pessoais relacionados à infraestrutura de telecomunicações (como estações), hoje monetizados de formas diversas pelas plataformas.
Outro tema que entrará em escrutínio é o consumo de franquias de dados móveis por peças publicitárias veiculadas pelas empresas de Internet. Neste caso, até mesmo o zero rating para anúncios é considerada uma medida possível, ao lado de outras alternativas de cunho mais educacional. A Anatel vê indícios de “abusividade” na veiculação das publicidades.
Em paralelo, a agência também teme o ambiente digital propiciando a “utilização e aprimoramento de mecanismos comportamentais que possuem profunda influência no consumidor e em suas decisões de consumo, por vezes de forma abusiva”. Neste caso, possíveis medidas poderiam ocorrer a partir da tipificação de condutas inadequadas ou através de regulamentos consumeristas já existentes.
Vale lembrar que a Anatel vê a avaliação do relacionamento de operadoras de telecom com clientes pessoas físicas e jurídicas como parte de sua competência legal, a partir da Lei Geral de Telecomunicações (LGT). Por isso a discussão sobre os deveres de usuários tem incluído não apenas grandes geradoras de tráfego, mas também players que fazem uso inadequado das redes (como responsáveis por chamadas abusivas) ou ilegal (como disseminadores de conteúdo pirata).
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