Já está em operação a plataforma do Observatório do Leite Orgânico, resultado de projeto de pesquisa liderado pela Embrapa Gado de Leite (MG), em parceria com instituições de ensino e pesquisa.
A plataforma traz dados como o histórico do número de criadores certificados, localização das unidades de produção e de processamento e informações sobre o mercado consumidor. A ferramenta também disponibiliza dados sobre a produção orgânica de leite e o mapeamento dos pontos de comercialização de lácteos orgânicos no Brasil.
“Nossa intenção é contribuir com a estruturação da cadeia agroalimentar do leite orgânico no País, ainda incipiente, mas que possui elevado potencial de expansão”, diz a pesquisadora da Embrapa Fernanda Samarini Machado.
A especialista afirma que esse “nicho de mercado está em crescimento e aproxima quem consome de quem produz, e valoriza a produção de alimentos integrada à natureza, respeitando o bem-estar dos animais, a qualidade de vida dos colabores e a saúde das pessoas”. Segundo ela, os princípios da produção orgânica estão alinhados à expansão de consciência da sociedade.
O que é leite orgânico
O leite orgânico é um alimento produzido em um sistema gerido de forma sistêmica como um “organismo agrícola” (daí vem o termo “orgânico”).
Por meio de várias técnicas alinhadas aos princípios da agricultura orgânica e regulamentadas por normas específicas, que buscam a integração entre a produção vegetal e animal, o equilíbrio do ecossistema, o desenvolvimento econômico e a maximização dos benefícios sociais.
A produção e o processamento do leite orgânico são regulamentados por lei, com garantia da qualidade e rastreabilidade por meio de certificação comprovada pelo selo “Produto Orgânico Brasil”, do Sistema Brasileiro de Avaliação de Conformidade Orgânica (SisOrg). Trata-se da Lei nº 10.831, de 23 de dezembro de 2003, conhecida como “Lei dos Orgânicos”.
Com a plataforma, a Embrapa reúne, em um único local, uma gama de dados de interesse do setor, como o número e a localização de produtores de leite orgânico registrados no Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos do Mapa, desde 2016.
Nela, também é possível localizar e incluir de forma participativa fornecedores de insumos, indústrias processadoras e canais de comercialização de lácteos orgânicos, como feiras, mercados e vendas on-line.
“Buscamos aproximar produtores, laticínios e consumidores, que se encontram dispersos geograficamente, para fortalecer a rede e facilitar o planejamento do setor”, diz o analista da Embrapa Fábio Homero Diniz.
“Caso eu seja um produtor de leite orgânico e precise encontrar um fornecedor de insumo ou laticínio especializado próximo à minha propriedade, a plataforma terá essa informação”, explica o analista. O mesmo acontece com os consumidores orgânicos que não sabem onde comprar leite e derivados orgânicos.
O Observatório também disponibiliza estudos e análises, permitindo interações capazes de propiciar a geração de inteligência estratégica e territorial para os diversos elos da cadeia produtiva. A expectativa dos pesquisadores da Embrapa é que os dados subsidiem a revisão de regulamentos técnicos e a formulação de políticas públicas adequadas ao segmento. A plataforma pode ser acessada gratuitamente neste endereço.
Características
- O leite orgânico pode ser produzido por vacas, búfalas, cabras ou ovelhas, criadas em regime de vida livre e acesso à área externa por, no mínimo, seis horas no período diurno.
- As práticas de manejo devem garantir a saúde e o bem-estar dos animais, que recebem alimentação e água de qualidade em quantidades adequadas.
- Na alimentação dos animais, não são permitidos: organismos geneticamente modificados, agrotóxicos sintéticos e fertilizantes minerais solúveis.
- O solo é nutrido com adubação orgânica e por meio de práticas de agricultura regenerativa.
- A manutenção da biodiversidade e a regeneração de áreas degradadas são fundamentais.
- O manejo é baseado na prevenção.
- Hormônios não são autorizados.
- Antibióticos são permitidos apenas quando a fitoterapia ou a homeopatia não surtirem efeitos. Nesse caso, devem ser seguidas as normas que regulamentam a produção orgânica, com os animais em tratamento retirados da produção e o leite descartado pelo dobro do período de carência descrito na bula do medicamento.
- As vacinas devem ser mantidas em dia, de acordo com a legislação sanitária.
Como a plataforma atua
Uma das motivações para a criação do Observatório do Leite Orgânico foi a grande demanda dos produtores por insumos específicos destinados à produção. “O setor carece de uma maior articulação entre as fazendas e os fornecedores de insumos orgânicos, que estão geograficamente dispersos”, diz Fernanda Samarini.
Um dos grandes gargalos apontados pelos produtores de leite orgânico é a escassez e os preços elevados de insumos para alimentação do rebanho, como o milho orgânico. “O avanço na produção está atrelado ao crescimento na oferta de milho orgânico a um preço mais acessível”, afirma a cientista, que defende: “é fundamental que a fazenda tenha baixa dependência de insumos externos, por meio da integração entre a produção vegetal e animal, da criação de animais eficientes e adaptados e de práticas de manejo adequado das pastagens, garantindo oferta de alimento diversificado e de qualidade”.
Os produtores também apontam dificuldades na comercialização. “Como atualmente não há grandes laticínios atuando na captação de leite orgânico, os produtores precisam processar e comercializar os seus próprios produtos, ou buscar parcerias com laticínios menores que processam e comercializam lácteos orgânicos”, explica Diniz.
Os produtores de leite orgânico precisam estar bem alinhados às demandas do mercado e trabalhar em estratégias de divulgação dos produtos. Na pesquisa sobre o perfil do mercado de leite orgânico no Brasil, os consumidores apontaram que o maior impedimento para aumentarem o consumo de lácteos orgânicos é a dificuldade de encontrar os produtos, seguido do preço mais elevado.
Alimentos orgânicos
Segundo a Embrapa, o mercado de alimentos orgânicos movimentou cerca de US$ 100 bilhões (4% de todos os alimentos e bebidas consumidos em 2017). O consumo global per capita anual cresceu 10% na última década, chegando a US$ 12,1. Entretanto, o consumo no Brasil ainda é pequeno (US$ 5 per capta/ano).
“Se considerarmos o peso dos alimentos orgânicos na dieta das populações de alguns países ricos como Suíça (consumo per capita de US$ 290) e Estados Unidos (US$ 130), podemos concluir que há grande potencial de expansão desse mercado no Brasil, associado à elevação da renda da população”, afirma Samarini.
O número de fazendas orgânicas em todo o mundo teve um aumento de cerca de 50% na última década, chegando a 2,8 milhões de produtores. O Brasil ocupa a 12ª posição em área destinada a essa modalidade de produção, com 1,2 milhão de hectares cultivados (0,4% das terras utilizadas pela agropecuária) e o leite já representa 20% de todas as vendas do segmento.
Há cinco anos, o volume de leite orgânico produzido no mundo era de cerca de 8 bilhões de litros, representando 1% da produção total. Os EUA lideravam o ranking com a participação de 26,1% do total, seguidos pela China (10,9%), Alemanha (10,3%), França (7,7%), Dinamarca (7,0%) e Reino Unido (5,1%). No Brasil, há cerca de 100 propriedades certificadas. A expectativa é que o número de produtores venha a crescer nos próximos anos com a entrada de Nestlé e Danone, multinacionais que atuam no País.
Um dos entraves que limitam o consumo é o preço. Os lácteos orgânicos podem custar até três vezes mais do que os convencionais. Mas os pesquisadores da Embrapa dizem que o aumento na escala de produção tende a reduzir essa diferença. Outro fator limitante é o desconhecimento por parte dos consumidores dos produtos certificados. O Observatório do Leite Orgânico traz uma solução para isso ao elencar os locais onde a produção ocorre.
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